E sobre o " footing", a paquera organizada


E sobre o ‘footing’, a paquera organizada

>>>  Você caro leitor ou leitora com 50+ lembra-se do chamado "footing", ou seja, a paquera organizada na praça. Homens de um lado, mulheres andando de outro? É sobre esses doces e românticos momentos que a crônica trata. 


                                                                                              - Celso Luís Gagliardo –

Tempos outros, com ação mais conservadora dos pais e sem a força da televisão e Internet, a juventude se organizava em praças públicas nos momentos de paquera, a troca de olhares sob interesse amoroso, que a influência inglesa chamou de “footing”, o passeio a pé.

Certamente o prezado leitor mais maduro e do interior tem recordações desse tempo que já se vai longe. Anos 50 e 60 e os centros das cidades, especialmente nas menores e médias, eram pontos privilegiados para os encontros, onde aos fins de semana moços e moças caprichavam nos melhores trajes para desfilarem alegremente buscando conexões.

Época em que não tinham as chamadas baladas, e a maioria não dispunha de recursos para frequentar e consumir em bares e restaurantes. Havia poucos clubes recreativos, quem podia se associava e desfrutava, além de bailinhos pontuais, alguns apelidados de “bailes de garagem” animados pelos aparelhos tocadores de discos de vinil.

No caso, lembro-me dos tempos de Sta. Bárbara, décadas de 60/70, jovens esperando o fim de semana para o passeio descontraído das 7 e pouco às 10 da noite. Havia um serviço de som por altos falantes e, sob música orquestral conhecida, a voz forte do Zé Rocha anunciava que, “com este prefixo musical deixa o ar o Serviço de Alto Falantes 9 de Julho, prometendo voltar amanhã, neste mesmo horário”.

A rotina era bem diferente e os comportamentos, também. Todos se recolhiam caminhando de volta à casa, sem medo de sofrer assalto, alguns acompanhados de mocinha bonita, em conversa animada e meio envergonhada, torcendo para não cruzar com os conhecidos pelo caminho.

Quase ninguém tinha carro. As moças casadoiras circulavam no “footing” em duplas ou trios, sentido à esquerda, e os rapazes na “mão” contrária. Quem será que inventou isso? Era o flerte à distância, protagonizado pela linguagem dos olhos, do aceno sutil. A fonte luminosa da praça ajudava a romantizar o cenário, iluminando o ponto central de encontros e prováveis namoros.

Alguns disfarçavam certo constrangimento de circular regularmente, e ficavam parados atentos às circunstantes, esperando a passagem daquela que estivesse lhe “dando bola”. Acontecia também de se ganhar um sorriso numa volta, e de repente e sem aviso a moça desaparecia, ia embora, e o guapo ficava a ver navios, esperançoso de reencontrá-la no próximo “footing” no jardim da praça Cel. Luiz Alves, entre caramanchões e frondosas árvores.

Alguns formaram parcerias sólidas nesses encontros. Namoraram, se casaram e constituíram famílias. Outros vivenciaram momentos de rica simplicidade e encantamento, lazer gratuito, saudável e ingênuo que ficou na memória afetiva, entre doces recordações.

O “footing” era a real paquera organizada, esperança de conquista sem pressa, depositário de verdades da vida - encontros, desencontros, emoções, decepções.

Impensável nos tempos atuais, de alta tecnologia e assustadora objetividade e volatilidade nas relações humanas, de praças vazias e tristes.

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