Furtos em Cemitérios, violação que revolta
Furtos em cemitérios,
uma violação que revolta
- Celso Gagliardo -
Na cadeira
de barbeiro, ou da cabelereira, ouvimos muitas histórias, involuntariamente ou
não. Outro dia, fiquei sensibilizado com o desabafo do cliente cuidado na outra
cadeira, falando para o seu “barbeiro” que estava indignado, pois o túmulo de
sua mãe foi furtado, retiraram a placa de metal com os dados da falecida, e
adornos. E enfatizava que seu lamento nem era por questões de custo, mas pela
invasão em algo tão íntimo e que deveria ser um espaço inviolável, quase
sagrado.
Noutra vez,
há mais tempo, testemunhei outro momento de desencanto: a pessoa chegou para a
tradicional visita ao Cemitério da Saudade, planejou comprar flores de cor
amarela para o túmulo de ente querido. Encontrou e levou para acondicionar na
floreira de metal adrede preparada. Ledo engano: larápios haviam furtado o
recipiente de bronze.
Os jornais
noticiavam à época uma série de ataques que os campos-santos vinham sofrendo.
Diversos boletins de ocorrência foram lavrados, inquéritos abertos e um ladrão
foi detido em flagrante. Uma estátua de quase 200 quilos estava sendo arrastada
do cemitério de Americana. Houve furto inclusive à luz do dia, num vácuo do
controle dos funcionários. Em Santa Bárbara também houve prisão, flagrante no
mesmo sentido.
Mas, para
espanto geral, os furtos continuaram acontecendo. No Cemitério maior de
Americana estão levando pequenas placas metálicas com nomes e datas,
referências dos respectivos jazigos. E com isso as vítimas estão apelando para
placas de plástico, acrílico ou inscrições na pedra, mesmo. Recomendam o uso do latão,
pois é mais leve e os larápios não deverão se interessar pela peça, mas dá para
acreditar?
A situação
atual parece mais controlada, as Prefeituras adotaram providências físicas e de fiscalização para
conter a onda.
Outrora
achávamos que as áreas de necrópoles eram intocáveis. Espaços sagrados de paz,
silêncio e oração, invioláveis e místicos. “O cemitério é a terra dos antepassados,
lembranças do nosso passado e presente que se chocam, onde as memórias afloram
e as lágrimas caem, sendo também um lugar de oração, de reflexão e também um
local de comunicação, pois é através das lápides que o morto, através dos
vivos, têm sua história contada (blog.psicologado.com).
Na forma
tradicional, os cemitérios possuem túmulos construídos conforme o desejo das
famílias. Embora um espaço com prova cabal da igualdade e finitude dos homens,
a configuração de cada sepulcro estampa a realidade das diferenças sociais.
Mesmo naqueles mais humildes há uma plaquinha de bronze ou cobre, para não
enferrujar facilmente, alvo dos larápios.
Mundo
violento. Em grande parte por causa das drogas que assolam a sociedade, vitimam
pessoas, destroem famílias. O homem vai à Lua e quase chegando a Marte, tecnologia e
inteligência avançam, e não conseguimos frear a escalada do mal representada
pelo comércio das drogas, fazendo cada vez mais vítimas que se rendem à
criminalidade para sustentar o vício e com isso enriquecer quem se locupleta
semeando o mal.
Até os
cemitérios passaram a ser alvo. No escuro da madrugada ou mesmo sob a luz do
Sol arrancam peças de nossas lápides que são certamente vendidas para a
reciclagem. Então, cobra-se fiscalização e, assim, mais custos com controles,
vigilância, iluminação fortalecida, portões fechados que aumentam nossas distâncias,
e câmeras por todo o lado invadindo privacidade.
Somos
“recepcionados” nos comércios com homens armados olhando-nos com certa desconfiança,
na chegada nos supermercados, padaria, banco, posto de combustível e até
em pequenas lojinhas de presentes. A realidade nos projeta “n” preocupações à frente. A vida está cada vez mais complexa, as comunidades cresceram
demais, não conhecemos as pessoas e ninguém “tem tempo”: cada um cuida somente
de seu umbigo - olhamos muito o virtual dos celulares e não vigiamos a
realidade ao nosso lado.
Até os mortos perderam o sossego. Violam-se seus túmulos, arrancam adornos, placas, vasos, puxadores, crucifixos, imagens de santos. E levam como sucata para derreter em troca de uns trocados. Círculo vicioso e triste do crime e da desagregação social.
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