O garçom que jamais sorri



O garçom que jamais sorri

                – Celso Gagliardo –

A mídia noticiou avanços nos serviços de restaurante, inovação parece ocorrida em Indaiatuba, com ampla repercussão e até um meme para mostrar-se moderna.

O salão onde ficam as mesas foi todo mapeado com tags no teto, de forma que o robô, devidamente programado, conseguisse se orientar e entregar os pratos às respectivas mesas.


No setor industrial, há tempo existem engenhocas chamadas “robôs” que executam funções variadas — muitas repetitivas e perigosas, como soldagem e pintura —, aumentando a produtividade nas linhas de produção.


Sem entrar na discussão sobre o desemprego de garçons, fico imaginando o desencanto de ver o robozinho reluzente procurando nossa mesa para servir um filé à parmegiana, por exemplo. Mesmo que acerte na primeira e até tenha nome feminino, jamais deixará de ser uma máquina fria, sem coração e sem emoções, sem um sorriso ou qualquer outra expressão humana.


Sim. Ainda que esse homenzinho da tecnologia seja “zero defeito” e balbucie algumas palavras (não sei se é o caso), nunca alcançará o padrão da comunicação humana — cheia de imperfeições, sujeita ao humor do momento, mas realidade que nos aproxima e acalenta. Necessitamos desse contato, e nada melhor que ser bem atendido por um garçom diligente que, às vezes, até nos chama pelo nome.


Almoçar num restaurante com serviço à la carte é singular. Saborear uma boa comida em mesa arrumada, cadeira confortável e com companhia familiar (ou não) é quase um convite ao paraíso da terra. São momentos mágicos, que infelizmente nem todos têm acesso.


A figura do garçom, de carne e osso, é absoluta e imprescindível: empurrando o carrinho decorado e exalando o perfume-gourmet, ou com a travessa sustentada pela mão ao alto e o cotovelo dobrado, tradição no servir.


Mesmo sem os robôs, a tecnologia já influenciou ambientes de alimentação antes quase sagrados. É muito comum vermos famílias inteiras, à mesa, quietas, apenas fitando os respectivos celulares. E agora, com um robô ao lado de apoio, vai ficar uma beleza... estimulando as crianças ao convívio humano cada vez menor. Progresso, avanços... para quê, e para onde?


Não experimentei ainda, mas terei dificuldade de aceitar robôs em operações de restaurante. Fico pensando na reação do ícone de servir no nosso tempo de Americana, o saudoso “seu” Zico, caso viesse a saber que sua profissão poderia ser afetada pela invasão de robôs. Ele certamente abriria um desconfiado sorriso e me diria:

— “Isso não é veeerrdade, ô barrrbarense!”

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